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A sua obra poética conta com os títulos Fadinhos (1896), Mal de amor: Coroa de Espinhos (1916), Manijas, Amor que salva - Santificação do Beijo (1916), Os Cossacos (1918) e Mornas cantigas crioulas (1932), publicada postumamente, por iniciativa de José Osório de Oliveira.
Cultor do verso em crioulo, Eugénio Tavares foi um dos primeiros a investir numa poética em crioulo e a defendê-lo como língua literária. Com as suas mornas, em crioulo, tornou-se um ídolo popular, destacando-se pela sua mestria em recriar a alma crioula.
Nos seus textos verifica-se:
- a procura de processos da lírica amorosa portuguesa, sobressaindo a frescura e a delicadeza do sentimento romântico;
- um profundo enraizamento no lirismo popular;
- a marca intensa dos apelos sociais e políticos daquela época cabo-verdiana;
- Em língua portuguesa, destacou-se como cultor do lirismo amoroso e do lirismo social;
- A sua lírica está impregnada de mística e religiosidade.
Integrante da primeira geração de poetas cabo-verdianos, Eugénio Tavares e outros poetas da mesma geração seguem, na literatura, o rumo traçado por José Lopes da Silva que se empenhou na defesa da Civilização Luso-Africana. Lopes estabelece a rota literária e os outros poetas, Pedro Cardoso, Eugénio Tavares e Januário Leite seguem o rumo traçado por ele. Pois, a poética de Lopes é aquela premiada pelas grandes Civilizações Europeias, inclusivamente a da França como sempre universalista e defensora da universalidade do Homem. Tavares segue Lopes, usando o modelo clássico dos seus sonetos. Todavia, acaba por se afastar da rota traçada por aquele, só navegando a vaga clássica. É ele que escreve, quase pela primeira vez, a lírica crioula, que aparece em forma de música no seu livro, Mornas cantigas crioulas (1932). Aqui vai começar a lírica, estabelecendo o grande paradoxo: querer ficar/querer partir donde a nossa literatura se inspira. Abre-se aqui o universo lírico de toda a nossa poética: a psíquica cabo-verdiana, a intelectualização da nossa escrita, a saudade… a nostalgia… o amor… a dor, a traição, as nossas montanhas, o nosso mar, as nossas estrelas tão nossas… as noites românticas, o veleiro encalhado à calma… o escuro de breu dos nossos vales, os naufrágios… a despedida no cais… o regresso dos pescadores de baleia, a sátira dum coração atraiçoado… duma hora maculada… enfim; a verdadeira alma cabo-verdiana fica poeticamente posterizada nas líricas crioulas tavareseanas… para além da estética musical que fica estabelecida nas mornas, o estado da alma crioula, humana e sofredora, revelada na simplicidade dos seus versos.
Inserimos aqui uma das mornas que não foi incluída na colecção Mornas cantigas crioulas que sobressai pelo mimo e frescura. A outra composição é um soneto, género que magistralmente cultivou.
Djam-crêbo Já m’cre-bo ma m’ca ta flá-bo M’ta gardâ dentro de mim, M’ta ‘ngachâ ês segredo Co medo bu ca flá-m’ sim.
Ma m’crê odjá-bô calado, Guardá-bo na pensamento, De que contá-bo ês nha amor, Pa depôs bu dá-m’ tromento.
“Não” é ca sabe de obi, É pior que maior dor; Por isso bu ca’l conchê, Bu ca’l conchê ês nha amor.
Triste, dixá-m’ fica triste Simcerteza amá sim gosto, Antes triste de incerteza, Do que triste de disgôsto.
Eugénio Tavares |
Emigração Como é triste e desolador, Ver partir, aos magotes, esta gente, Entregue ao seu destino, indiferente A tanto sofrimento, tanta dor!
Se a sorte ainda a traz à terra amiga, Macilenta, tristonha, depaup’rada, Com a doença do sono, já minada, Ao cemitério um só coval mendiga!
Mas porque ides, assim arrebanhada, A essa maldita terra do desterro? É a fome que vos leva acorrentada?
Aproveitai melhor a mocidade E ide mais distante, ide à América A terra do trabalho e liberdade! Eugénio Tavares
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HOMENAGEM AO JORNALISTA E POETA
Melhores palavras não há que as do Poeta José Lopes para homenagear a personalidade do mês que é Eugénio Tavares. Não por nos faltar a aptidão, mas porque se trata de um vate da literatura cabo-verdiana glorificando seu contemporâneo, outro vate tão grande quanto aquele que o homenageia.
(Eu)Génio Tavares
Há nomes que são uns símbolos.
Tal o de Eugénio Tavares.
Lembra-lo, proferi-lo ou escrevê-lo é concretizar a ideia de tudo quanto há e pode haver de mais elevado na alma colectiva da grande família cabo-verdiana; é simbolizar, portanto, a mais fina essência intelectual de uma pátria, o que ela tem de indestrutível.
É pois um nome símbolo; e é também um nome expoente, que eleva a um grau eminente o pensamento cabo-verdiano.
Sintetiza e define a sua terra.
Parece que o ministério das cousas (porque o há em tudo) andou a conspirar no seio arcano do destino para que ao encantador orfãozinho da Badinha lhe pusessem Eugénio.
Há predestinações. Houve aí uma.
O nome define o homem. O homem justifica o nome.
Esse simpático ser bem formado, essa admirabilíssima organização proteiforme de intelectualidade em que predomina o poeta, vinha ser o continuador de Augusto Barreto, do Dantas e de Luís Medina.
Assim, pois, tiveram porventura uma inspiração do Desconhecido os que lhe puseram Eugénio.
Há influxos que o espírito humano, ainda sobre a Terra, não penetra: - porque ninguém sabe da essência do que existe.
Nas mais antigas doutrinas esotéricas foi de um sem número de misteriosas coincidências que nasceram os horóscopos. Eugénio – foi o horóscopo de si mesmo.
Ainda no berço o futuro grande poeta cabo-verdiano, quando só Deus ainda o sabia, quando ainda se não tinha revelado nem podia revelar-se, já assim se chamava.
E que de exemplos e lições na sua vida!...
Estava escrito que o selo da orfandade o devia consagrar quando ainda envolto nas faixas infantis. Não há consagração sem martírio.
A criança-prodígio que Barreto não viu, que Dantas idolatrou e que Luis Medina apresentou no Templo das Musas pressentindo-lhe, como Chateaubriand a Vitor Hugo, o que traduz a segunda parte do seu nome, essa lirial e encantadora criança estava predestinada a encher, a saciar de luz, - a luz fulgurante dum dia eterno -, a nossa querida Terra Cabo-verdiana, elevando-a nas asas resplandecentes da poesia a um grau eminentíssimo do honrosa fama.
Sá não sentiu ungir-lhe a fonte branca de neve um beijo materno de sacrossanto estímulo ao escrever os seu primeiros versos!...
Tinha de ser assim… Do contrário esses seus primeiros carmes não seriam uma pungente elegia chorada no regaço da sua mãe-segunda em memória da primeira.
A Dor santificou pois desde o berço o sublime poeta cabo-verdiano. O augusto nume do Sofrimento tem presidido sempre ao seu destino, mas para o consagrar; mas para o tornar sempre grande, muito grande, cada vez maior; mas para lhe depor na fronte inspirada a imarcescível laurea da imortalidade.
O Grande Poeta vive hoje no seu splendid isolement da risonha Brava, onde nasceu, a Brava que o idolatra e que Ele tanto ama; porque Ele é a Brava e a Brava é Ele; e a Brava porque é Ele, porque o encerra no relicário das suas formosas filhas e das suas flores, incomparáveis de matriz e fragrância, resume em si Cabo Verde.
Hoje como seus compatriotas vimos render ao grande Poeta uma justa e devida homenagem. À sua coroa de louros quero prender uma palma; quero ligar o meu lemnisco triunfal à sua vida toda de luz.
Deixemos depois o grande poeta no seu remanso, no seu sonho, no seu afastamento do mundo que o não poderá sempre compreender. As estrelas não foram feitas para serem observadas de perto pelos homens.
Algum dia a admiração piedosa dos vindouros erguer-lhe-á monumentos, sobreporá a sua estátua ao pedestal que Ele próprio erigiu exaltando a sua terra. Esta glória não nos pertence: está reservada aos nossos descendentes. Viverão em mais luz. Verão mais que nós.
Vós todos que me ledes, vinde comigo junto dele trazer-lhe amor e flores.
Ele é uma autêntica, legítima glória da nossa terra.
Deus vos diz:
“Onorate l’altissimo poeta”
Janeiro de 1931
José Lopes
Enquadrado na nossa estratégia de divulgação de escritores, o Projecto "Escritor do Mês" (dos professores de português da Escola Secundária Dr. Baltazar Lopes da Silva) elegeu para Outubro o escritor, poeta e jornalista Eugénio Tavares cujo dia do seu nascimento é também o dia nacional da cultura cabo-vediana.
Notas biográficas
Eugénio Tavares
Eugénio (de Paula) Tavares nasceu no dia 18 de Outubro de 1867 na Ilha Brava do Arquipélago de Cabo Verde, onde faleceu em 1 de Junho de 1930.
Foram seus pais, Francisco de Paula Tavares, natural de Santarém (Portugal) e Eugénia Rodrigues Nozoliny, natural da Ilha do Fogo, de ascendência espanhola.
Do Boletim Oficial n.º 31., de 29 de Julho de 1876 consta que Eugénio “foi examinado nas disciplinas de leitura corrente, escrita (bastardo e cursivo) subtracção, multiplicação e divisão em números inteiros, gramática recitada e doutrina cristã, tendo obtido a classificação de 20 valores”.
Com a idade de 15 anos e “possuindo apenas o a, b, c da instrução primária” ele fez a sua estreia literária no almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro, apresentado pelo poeta Patrício Luiz Medina Vasconcelos, que enalteceu o seu talento, embora ressalvando que o mesmo “não medra como deverá, no acanhado ambiente do viver, poético sim, porém demasiado aldeão, da Ilha Brava.
Não há dúvida, porém, que essa estreia já revelava decidida vocação para as Letras e apreciáveis conhecimentos da língua e da metrificação, como reconheceu o apresentador, para quem essa amostra representava “uma eloquente promessa”, apesar das falhas que apontou, embora reconhecendo que “a ideia é bem conduzida”.
Não consta que Eugénio Tavares tenha sido submetido a exames do ensino laico ministrado no então Seminário-Liceu de S. Nicolau, mas sabe-se que, concluída a instrução primária, ele estudou com o Padre António de Sena Barcelos, António Almeida Leite e Rodrigues Aleixo.
Por outro lado, era grande o interesse pela cultura e havia, em quase todas as ilhas, gabinetes de leitura frequentados com interesse pelos sócios respectivos.
Eugénio fez-se autodidacta, em grande parte graças à biblioteca existente na casa onde se criou desde os primeiros dias da sua infância, visto que a mãe morreu de parto, sendo tratado como filho querido tanto pela madrinha, Eugénia Medina Vera-Cruz, como pelo marido desta, Dr. José Martins Vera-Cruz, médico.
O pai ausentou-se para Guiné, onde faleceu 3 ou 4 anos depois.
Quando se aproximava dos vinte anos (1885?) Eugénio conseguiu emprego numa casa comercial do Mindelo (S. Vicente) cujo proprietário exercia funções de agente consular dos Estados Unidos da América, circunstância que proporcionou o seu contacto com americanos de passagem por S. Vicente.
O Porto Grande nessa altura era visitado anualmente por cem mil passageiros em trânsito para o Brasil, Argentina, África do Sul, Ásia e Europa, pelo que a cidade do Mindelo, já se tinha transformado no maior centro populacional de Cabo Verde, com maiores possibilidades de desenvolvimento, sob todos os aspectos - económico, social e cultural.
Na REVISTA DE CABO VERDE (1899) Eugénio viria a recordar o espectáculo a que assistia diariamente, quando as ruas de Mindelo se enchiam de estrangeiros.
Diz ele: “é um espectáculo verdadeiramente original duma população flutuante que os grandes transatlânticos despejam ali, e que, desembarcando de manhã e partindo á noite, fazem daquilo uma extraordinária feira cosmopolita, um acampamento de multidões que passam para a América do Sul e que regressam á Europa e Ásia; ruas atulhadas de gente que fala em todas as línguas, espécimes de todas as raças, exibição de todos os vestuários, de todos os costumes, de todos os tipos, desde o salero das filhas de Espanha ás figuras sentimentais das misses tísicas; desde o rabicho do chinês até o punhal do corso”.
De um iate americano desembarcou certa vez uma jovem por quem Eugénio se apaixonou à primeira vista e a quem o soneto Kate (nome da moça) no qual diz:
“Foi pálida visão ante a qual um momento
Minh’ alma se ajoelhou, tremente e subjugada;
Foi róseo turbilhão, foi nuvem perfumada
Que agrilhoou sem do meu vário pensamento.
Depois a bruma além, esconde a minha amada
E o triste olhar cravei no plúmbeo Firmamento”.
Eugénio era “um lindo moço, formoso de rosto e de mais formosa cabeleira, de tez branca, não rosada mas um tanto pálida, fronte ampla e majestosa, olhos negros de luz vivíssima e ao mesmo tempo suave, o nariz perfeito, finos os lábios de fina comissura, alvas as finas mãos, o cabelo retintamente preto, ondeante, farto e sedoso, doce o sorriso e esbelto o porte” (José Lopes).
Mas o pai da moça, aparentemente condescendente, acabou por levantar ferro e zarpar do porto pela calada da noite, enquanto a filha dormia, pois esta pedira ao pai autorização para se casar com Eugénio, que iria com eles para América.
A surpresa de Eugénio não foi por certo muito grande, já que a sua situação de modesto empregado de escritório não lhe permitia encarar a hipótese de convencer Kate a ficar com ele em Cabo Verde, sem o consentimento do pai.
De qualquer maneira, Eugénio passou a pensar na possibilidade de melhorar as suas condições de vida, vindo a conseguir o lugar de recebedor no Tarrafal (Santiago) onde trabalhou até ser nomeado recebedor do concelho da Brava, em 1890.
De regresso à sua terra natal, casou-se com Guiomar Leça Tavares, de quem não teve filhos.
Cerca de dez anos depois, é injustamente acusado de alcance, pelo que teve de fugir para a América do Norte, para não ser preso. Em seu entender, não fugiu mas sim retirou-se. Porque – diz ele – “fugir é cobardia; retirar pode ser, ainda, um ponto de táctica.
Chegado à América, em 11 de Julho de 1900, fixou-se na cidade de New Bedford, onde, viviam milhares de cabo-verdianos, e pensou na possibilidade de editar um jornal, como forma de subsistência, já que não tinha nenhuma experiência que pudesse facilitar-lhe o ingresso em qualquer das profissões acessíveis a imigrantes.
O primeiro número desse jornal, a que deu o título de ALVORADA, insere um artigo intitulado Autonomia, no qual faz algumas considerações sobre a situação política em Cabo Verde e na África, terminando por glosar uma frase célebre de um revolucionário americano – “África para os africanos!”
No final do século XIX, quando já se reflectiam em Cabo Verde os efeitos da propaganda de ideias republicanas em Portugal, Eugénio fez-se republicano e, numa das suas viagens à América, entro para a maçonaria.
Quando da implantação da República, ele encontrava-se de novo na Brava, e fez questão de ir a Praia assistir à chegada do primeiro governador nomeado depois do 5 de Outubro de 1910.
Nessa altura começou a fermentar a ideia de se publicar na Praia um jornal, de que ele viria a ser o principal colaborador, a convite do editor, Abílio Monteiro de Macedo.
Bom dia quem tem acesso a correção do teste I . Ma...
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